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Capítulo Vinte - A Decisão | Parte 1

Pedro sentia-se mais aliviado. Compartilhar sua angustia com os amigos foi a melhor coisa feita. Agora teria que tomar uma decisão. Ir a sua cidade natal e ajudar como pudesse seu padrasto ou ficar esquecendo a carta sabendo que ele morreria. Devido ao tempo em que tinha ficado conversando, tiveram que deixar o resto daquela conversa para mais tarde, combinou com os três amigos para irem à sua casa.
Voltou para a empresa junto com Nathan. Ana iria ao hospital para atender alguns pacientes, mas à noite estaria livre. Por estar mais calmo, desenvolveu seu trabalho tranquilamente. Não tinha muito que fazer, a empresa passava por um bom momento e os problemas estavam ficando quase extintos. Passar o tempo foi muito fácil.
À noite, voltou para sua casa antes dos três, queria arrumá-la e preparar algo para comerem. Estava terminando o jantar quando Nathan chegou trazendo Marta. Ana foi a última a chegar, devido ao número de pacientes atendidos naquela tarde. Todos reunidos à mesa, comeram primeiro, apesar de conversarem, não falavam sobre o assunto que iriam discutir. Terminado o jantar, reuniram-se na sala.
- Realmente você está numa situação difícil.
- Eles já sabem?
- Já. Contei hoje.
Marta se levantou e deu-lhe um abraço.
- Fico feliz por você. Você está conseguindo superá-lo.
- Obrigado Marta.
- Desde quando você me contou, estou pensando em toda a situação. Coloco-me em seu lugar, tento me imaginar passando por tudo e agora ter que tomar uma decisão tão difícil. – começou Nathan.
- Concordo com você, Nathan. – continuou Ana. – Pensei muito no que você está passando. Às vezes acho que você deveria ficar. Esse homem fez você passar por momentos repugnantes. Mas penso que tomando essa decisão, seriamos iguais a ele.
- Calma! Primeiro é melhor ouvirmos Pedro e sabermos o que ele está pensando.
- Obrigado aos dois, e a você Marta. Quando fui aos Estados Unidos, achei que estaria livre de vez desse assunto, mesmo nunca conseguindo esquecê-lo. Estou pensando nisso desde quando recebi a carta. Quando acho que devo ajudá-lo, vem a minha mente todo aquele sofrimento, já passei muitas noites em claro lembrando tudo.
- Falando em carta, você ainda não me mostrou. Tudo que sei sobre seu conteúdo foi o que você me falou na empresa.
Pedro tirou a carta de seu bolso e entregou a Marta, os outros ficaram em observação enquanto ela lia.
- Pelo que posso notar, ele quer seu perdão.
- Deveria ter pensado nisso quando praticava aquelas coisas…
Sentia muita raiva, por isso aquela decisão tornava-se mais complicada. Seus amigos mostravam os dois lados da moeda. Analisava cuidadosamente, não gostaria de arrepender-se daquilo que decidiria.
- Olhando melhor agora, não ajudaria. – confirmou Nathan. – Se eu tivesse passado pelo que você passou, não conseguiria chegar aonde você chegou... isso se eu não o tivesse matado.
- Nathan! Isso não é coisa para falar nem brincando.
- Ele está certo. Desde o primeiro abuso eu desejava matá-lo, fazê-lo sofrer tudo aquilo pelo que passei.
- Você é meu amigo há tanto tempo e sempre percebi que esses abusos lhe transformaram, moldaram-lhe o caráter. Hoje você é uma pessoa melhor por causa dos abusos, não estou dizendo que as atitudes deles foram certas, mas talvez você não tivesse chegado até aqui.
Marta tinha razão. Ficara mais forte a cada abuso, mas, ajudando-o, estaria concordando com ele e dando liberdade a outros a fazerem o mesmo.
- Os abusos podem até ter deixado-me mais forte, mas há outras formas de educar uma criança. Não precisa violência, nem uma atitude tão terrível quanto a que ele praticou.
- Faz poucos dias que reencontramo-nos, mas, durante esse tempo, percebi o quanto você é uma pessoa maravilhosa.
- Quando você chegou aos Estados Unidos, notei uma pessoa diferente das outras. Uma pessoa querida que logo aprendi a amá-lo e respeitá-lo.
- O que ele lhe fez foi algo terrível, mas seja diferente dele, faça a diferença. Você, ajudando-o, estará mostrando ser o oposto dele. Durante esses anos você conseguiu superar e usar esse mal para o bem.
Todos estavam certos. Negando-o mostraria ser semelhante, mas se ajudasse, mostrava ser uma pessoa superior. Seus amigos continuaram a discutir, enquanto ouvia-os, olhava para os lados até que parou em um local. Em cima da mesa havia uma foto sua com seu pai. Seu pai tinha sido uma pessoa incrível, o que ele faria nessa situação?
Aquela reunião terminou sem uma conclusão certa. Todos mostraram suas opiniões, mas a decisão final teria que ser de Pedro. Antes de conseguir dormir, ficou pensando em tudo o que foi falado, mas o que mais pensava era em seu pai. Queria tê-lo ao seu lado ajudando-o a tomar aquela decisão.
No dia seguinte foi à empresa sem nem tomar a decisão. Chegando a sua sala ficou surpreso com uma visita. Benedito estava esperando-o.
- Aconteceu alguma coisa?
- Não. Marta me contou tudo, por isso vim. – Pedro ficou constrangido. – Há muito tempo trabalho nesta empresa. Como você sabe, conheci seu pai. Quando você veio substituir seu pai fiquei surpreso e impressionado. Vocês dois são bastante semelhantes. Ele gostava muito de ajudar, assim como você, até mesmo aquelas pessoas que tinham feito mal e sei que, se ele estivesse na sua situação, ele ajudaria.
Pedro ficou emocionado e chorou.
- Obrigado Benedito, você me ajudou muito.
Benedito se retirou deixando Pedro chorando. Pegou uma foto de seu pai e ficou encarando. Fazia muito tempo que não conversava com alguém que convivera com ele e sabia tanto. Aquelas palavras ajudaram Pedro a tomar sua decisão. Iria ajudar Samuel, mesmo depois de tudo que ele fizera passar. Ligou para os amigos informando a decisão. Combinou com Nathan para acompanhá-lo, não queria ir sozinho e encarar todo o problema. Ana se ofereceu para ir, conseguiria tirar uma semana de folga. Marta tentou acompanhá-los, mas Pedro pediu que ficasse para tomar conta da empresa. Ficou combinado de, no dia seguinte, realizarem a viagem. Não poderiam esperar mais, a qualquer momento algo grave poderia acontecer.
Os primeiros a viajar foram Pedro e Nathan, Ana iria depois, pois antes tinha que atender alguns pacientes e ainda teria plantão. Durante todo o percurso, Pedro permaneceu calado e seu amigo respeito aquele momento. Estava escuro e ainda não tinha chegado. Nathan conseguiu cochilar durante boa parte da estrada, em alguns momentos se ofereceu para dirigir, mas Pedro recusava. Quando chegaram à pequena cidade, foram a uma pousada, Pedro queria descansar, também não tinha coragem de encontrar-se com os dois logo naquele dia.
[...]

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